O Blog Listas Literárias leu Fascismo: Um Alerta, de Madeleine Albright publicado pelo selo Crítica do grupo editorial Planeta; neste post as 10 considerações de Douglas Eralldo sobre o livro, confira:
1 - Comprometido com os direitos humanos, a liberdade e a democracia pelo mundo, Fascismo: Um Alerta é o que definitivamente se propõe, um sinal e um convite à reflexão, um alerta ao perigo do fascismo que incendeia o mundo (e como temos sentido, o Brasil não está imune desta força autoritária) e põe em risco evoluções globais, principalmente o ideal democrático, defendido intensamente por Albright, e acima de tudo, produzindo um cenário temerário de um novo mergulho em sombras e trevas da história da sociedade humana;
2 - Mas acima de tudo, devemos reforçar o caráter de autoridade presente nos ensaios que compõe este livro. Não só pelo fato de Madeleine Albright ter sido Secretária de Estado de 1997 a 2001 no governo de Bill Clinton e por razão de seu trabalho ter percorrido o mundo discutindo e praticando política. Também não e pelo fato de ter sido embaixadora da Onu, ou pelas disciplinas que leciona na Georgetown University. A riqueza e a autoridade lhe são fortemente conferidas pela marca da experiência, pelos relatos de que sofreu na pele e na prática os fascismos do Século XX, de quem não conhece as atrocidades de Hitler, Mussolini e outros pelos às vezes abstratos relatos. Albright foi vítima do fascismo, uma sobrevivente da 2º Guerra Mundial, e isso, claro, torna seus argumentos ainda mais potentes;
3 - Todavia, é claro que essa experiência a influencia de várias maneiras, especialmente com as condescendências à nação que lhe acolheu, os Estados Unidos, para quem dedica grande preocupação pós efeitos Trump e seus perigos, mas que nem sempre é capaz de observar com mais criticidade a longa história de imperialismo do país. Isso, contudo, não macula este verdadeiro manifesto pela democracia e pela liberdade que é esta publicação;
4 - Dito isto, podemos dizer que os artigos, escritos numa argumentação coerente, lúcida, mas sem perder o potencial de alarme e alerta é ótima introdução para debates acerca do fascismo, termo que volta à pauta social e política mas que nem sempre é apropriado por aqueles que acusam-se "fascista!" algo bastante frequente hoje no Brasil, e não sem termos nossos motivos, claro. Nesse sentido, a publicação é equilibrada e fornece munição aos que como autora temem este novo momento global, ao passo que, talvez minha esperança de tolo, possa desnudar aos nublados por essa perigosa onda, e perigosa realidade que se começa a trilhar;
5 - E para discorrer sobre o tema, Albright parte de uma breve discussão, que traz inclusive as contribuições de suas salas aulas, estabelecendo o fascismo como "uma doutrina de raiva e medo" para então a partir do debate centralizando em cada artigo uma determinada figura histórica, do passado e do presente, para argumentar as bases do fascismo até o momento global presente, que para preocupação da autora e de todos que acreditam na democracia e na liberdade, é uma hora um tanto preocupante. Para Albright "um fascista é alguém com profunda identificação com um determinado grupo ou nação em cujo nome se predispõe a falar, que não dá a mínima para os direitos de outros e está disposto a usar os meios que forem necessários - inclusive a violência - para atingir suas metas";
6 - Assim, embora no conjunto geral as preocupações da autora sempre retornem às sementes do fascismo plantadas em solo americano com a eleição de Trump, seu olhar é global e percorre o mundo tratando e discutindo experiências do agora e mesmo das décadas recentes revelando de certo modo que se o atual momento nos parece uma nova explosão do fascismo, suas sementes já vinham sendo plantadas desde o pós Guerra. Para tanto, percorreremos da Venezuela à Turquia, da terra natal da autora, Tchecoslováquia às ditaduras latino americanas (algumas como as Filipinas deveriam ser vistas como grande alerta ao Brasil) refletindo as ações e as decisões políticas permeadas com tais sementes funestas;
7 - Se como disse, Albright sempre volta ao problema Trump, vale dizer que o faz com as devidas razões. Mesmo com um posicionamento critico de nossa parte aos inúmeros defeitos da democracia americana, inclusive quando ela decide meter-se na democracia dos outros, não podemos negar que o país até então sempre liderou a narrativa democrática, o ideal americano inclusive é pautado sempre nisso. Por isso deve de fato assustar a ascensão de um governante que despreza e enfraquece todo esse ideal e cujos efeitos ainda conheceremos e viveremos. Ademais nossas desconfianças de a democracia americana permanecer, se dá justamente pelo sólido histórico de suas instituições e mecanismos de controle, visão que parece ser endossada pelas argumentações de Albright, e que ao mesmo tempo angustiam quem vive em democracias frágeis, caso brasileiro;
8 - Falando em Brasil, a leitura do livro é fundamental para compreendermos o quão nossos problemas locais e as ameaças fascistas tropicais estão inseridas num quadro global de incertezas e cujos movimentos não são isolados. Creio que compreender o fascismo à brasileira nesse contextos talvez nos traga mais perguntas do que respostas, contudo amplia nossas perspectivas e nossas ferramentas de análise, ainda que não saiba se isso pode ou não colaborar com alguma "vacina" aos iminentes perigos que nos ameaçam agora;
9 - Aliás, vale dizer que se Madeleine é exitosa em apontar-nos os perigos, identificar as experiências que hoje fazem do fascismo um risco iminente e de como uma nova legião de autocratas assumidos ou não tem cativado as massas com discursos retrógrados, por outro lado ela não arrisca-se a dizer quais as causas que fragilizaram nossa sociedade a permitir que boa parte dela volte a encantar-se com cantos de sereias medonhas. Timidamente chega tocar no papel da tecnologias nesse drama, a economia, mas talvez com bastante honestidade deixa-nos com essa pulga, uma pulga que também compartilho, ainda não sabemos bem sua localização e suas razões;
10 - Enfim, em um mundo cujos líderes são Trump e Putin (o livro aborda ambos) e que no caso do Brasil também tenhamos nossas versões de neofascistas, o alerta de Albright é urgente (e talvez nos chegue tarde demais). Aos que procuram compreender o que é fascismo as duas últimas páginas são essenciais, e a autora por meio de simples indagações ajuda a identificar os portadores do ideal fascista. Entender o fenômeno é dolorido e melancólico, em parte porque já vimos esse filme antes e tem quem queira reproduzi-lo, e principalmente porque no lado oposto do fascismo, com suas fraquezas e defeitos é verdade, estão os líderes do ideal democrático que "nos convidam a unirmo-nos na construção e manutenção de um centro saudável para nossa sociedade, um lugar com justa distribuição de direitos e deveres, respeito ao contrato social e espaço para todos sonharem e crescerem". A este blogueiro isto parece mais sensato e também muito mais civilizado.
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