10 Considerações sobre Pela Boca da Baleia, de Sjón, ou sobre o voo do pilrito

O Blog Listas Literárias leu Pela Boca da Baleia, de Sjón publicado pela Tusquet editores; neste post as 10 considerações de Douglas Eralldo sobre o livro, confira:

1 - Pela Boca da Baleia entre os mitos islandeses e cristãos nos mergulha numa jornada metafórica tomada de elementos fantásticos narrados por um erudito dos longínquos anos 1.600 revisitando uma época de embate entre ciência, religião e fantasia quando alguns limites começavam a ser estabelecidos;

2 - Assim nos deparamos com a jornada de Jónas Pálmason, um homem curioso e cujo preço pela curiosidade e apreço pela ciência da observação natural lhe será bastante alto diante do impacto e das oposições que irá encontrar por causa de seus feitos e descobertas que lhe imputarão um acréscimo ao seu nome, "o erudito";

3 - E conheceremos a penosa jornada do narrador já quando de sua situação enquanto degredado em uma ilha, expulso dentre os seus justamente por suas façanhas, de modo que será sua narrativa permeada pela falta de lucidez em certos momentos, algo condizente ao homem que cumpre pena num lugar remoto, isolado e frio que a resistência pela sobrevivência coexistirá com a rememoração de seus dramas;

4 - E o rememorar do Jónas nos colocará num embate entre fé e ciência, entre o medo do novo e a segurança do já conhecido ainda que sob pilares frágeis. Além disso, será a narrativa de um homem híbrido, um cristão de grande fé ao mesmo tempo de um naturalista que aos poucos com seu trabalho vai desmistificando as fantasias e as crenças ao mesmo tempo que as vive, entre fantasmas, assombrações e monstros desconhecidos;

5 - Deste modo somos jogados a um ambiente imagético onírico e fantástico ao passo que perpassamos por uma série de mitologias e crenças, estas que, aliás, conduzem toda a narrativa, por sinal, uma espécie de releitura para o mito de Jonas e a baleia;

6 - Assim, o livro de Sjón embrenha-se por terrenos aparentemente distintos, pois acaba falando de elementos que hoje estão totalmente dissociados como magia, religião e ciência mas que todavia para a época de ambientação da narrativa, ainda que possa soar-nos estranho, faz sentido para um narrador pertencente a um mundo cujas fronteiras entre tais elementos não era de modo algum tão nítidos;

7 - Aliás, será preciso a respeito do tempo da narração realizar alguns apontamentos, e claro, levando-se aqui a liberdade ficcional e o desconhecer da versão original, a tradução contudo nos traz palavras de certo modo fortemente marcadas pela nossa contemporaneidade, e, em alguns dos casos até mesmo inexistiam à época em que se ambienta a narrativa, o que não é um imenso problema, mas que por certa frequência acabam chamando a atenção e destituindo um pouco a autoridade do narrador;

8 -  Dito isto, podemos ainda ressaltar certo pendo lírico da narrativa, tanto que para além da prosa cadenciada termos poemas distribuídos pelo romance que então faz o contraponto às palavras "modernas" presentes e que para além disso ressaltam a natureza "fantástica" e metafórica da obra enquanto o narrador além de suas lembranças e observações nos revelará um sociedade envolta pelo poder místico dos rituais e das crenças que muitas vezes são incapazes de compreender;

9 - Assim temos um romance que retoma a luta entre a razão e a fé (isto internamente), entre a ciência e as religiões, entre os mitos e o naturalismo de tal modo que o grande estranhamento é o de justamente vermos numa publicação tão recente, que por meio de uma narrativa tomada pelo encantamento da fantasia nos fala de uma série de crenças e mitologias de uma forma onírica e inesperada para os tempos atuais que a torna um tanto deslocada ao passo que a torna também original ainda que tais questionamentos já tenhamos visto por aí, tanto em nosso passado recente como no mais remoto, quicá contemporâneo a Jónas Pálmason;

10 - Enfim, Pela Boca da Baleia nos interessa justamente pela estranheza que nos causa sua existência em seu presente, num livro dotado de elementos fantásticos que literalmente (a despeito do léxico) nos leva a um passado mítico entre crenças e descobertas, que para além deste estranhamento provocado pela abordagem e pelo visual dos seus mitos, trata-se de uma narrativa em que pelo menos criaturas e coisas fantásticas ainda são possíveis numa jornada embrutecida pelo frio do ambiente e pela perseguição provocada pelo medo das descobertas de tal modo que o narrador percorrerá uma jornada completa de moléstias e privações;



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