10 Considerações sobre Não Tive Nenhum Prazer em Conhecê-los, de Evandro Affonso Ferreira

O Blog Listas Literárias leu Não Tive Nenhum Prazer em Conhecê-los, de Evandro Affonso Ferreira publicado pela editora Record; neste post as 10 considerações de Douglas Eralldo sobre o livro, confira:
1 – Um coquetel de antidepressivos e uma dose de coragem são necessários para a leitura de Não Tive Nenhum Prazer em Conhecê-los, uma obra de intensa reflexão composta por solidão e amargura de um homem de noventa anos de idade que faz um balanço pouco estimulante de sua passagem pela terra;

2 – Mas antes de penetrarmos um pouco mais sobre este olhar inamistoso à velhice, falemos primeiro da estrutura estética deste interessante trabalho de Evandro Affonso Ferreira. Proposto a ser um “romance mosaico” é literalmente disto que se trata o livro, construído a partir de diversos aforismos que montam o “mosaico” da vida do narrador, um senhor de 90 anos que escreve sobre vida, morte, solidão e angústia ao mesmo tempo que vai revelando detalhes de sua existência;

3 - De certa forma não tem como deixar de aproximar a obra de Ferreira do clássico modernista Memórias Sentimentais de João Miramar, logicamente resguardando-se as diferenças de estilo, ambos utilizam-se da fragmentação para construir um todo, o qual o leitor é partícipe-construtor;

4 – Aliás, o romance mostra-se dedicado à linguagem, a qual é dotada de eruditismos e novas construções que demonstram as intenções do autor para com as palavras, buscando sempre causar impacto e efeito sobre os leitores;

5 – Dito estas considerações iniciais, importa dizer ao leitor que estamos de uma obra exigente durante sua leitura, pois o texto que intercala desesperança com acidez nos atingem com sua rudeza crua, muitas vezes um soco na boca do estômago tratando da velhice sem poesia e encantamentos;

6 – Além disso, a obra é marcada pelos conflitos do narrador-protagonista, um velho ateu, e que talvez por isso seu olhar realista e duro acerca da velhice tenha uma carga mais virulenta visto que aqui não há remédio ou consolo que amenize a presença incômoda da vizinha morte;

7 – Por isso tudo uma das palavras que poderiam qualificar com certa propriedade a narrativa é sufocamento, sufocamento de um velho senhor preso numa cidade apressurada que através de seus aforismos-peças-mosaico destila rancores, inquietude mas acima de tudo um claro desencanto, sentimento, aliás, bastante presente na literatura brasileira recente;

8 – Todavia há ainda a dor da solidão provocada pela ausência do amor, da perda “daquela que volta jamais” uma paixão curiosa, que a despeito do que imaginamos no começo, temos de reconfigurar tudo depois das revelações das peças-mosaicos provocando a reflexão sobre quão intenso e quanto tempo pode durar o grande amor;

9 – Há ainda uma série de questões literárias que surgem ao longo da obra, inclusive diversas tentativas de explicar a necessidade de se escrever, além é claro da presença de diversas vozes que sopram ao ouvido do narrador, completando a erudição através da riqueza de influências e conhecimentos de seu narrador que traz para o livro diversas e cultas referências;

10 – Enfim, Não Tive Nenhum Prazer em Conhecê-los é leitura exigente, destas que sugam e desgastam-nos durante a leitura, e isso tudo de maneira muito positiva porque podemos afirmar tratar-se de ambiciosa e pungente literatura brasileira.


Postar um comentário

Postagem Anterior Próxima Postagem