10 Considerações sobre O mito de Sísifo, de Albert Camus ou porque este livro é um absurdo

O blog Listas Literárias leu O mito de Sísifo, de Albert Camus publicado pela editora Record; neste post as 10 considerações de Douglas Eralldo sobre o livro ou porque ele é absurdo, confira:

1 - Em O mito de Sísifo temos a canônica fala de Camus quanto ao único problema filosófico sério: o suicídio, "julgar se a vida vale ou não a pena ser vivida" é para Camus "responder à pergunta fundamental da filosofia". E é com uma pedrada desse porte que o pensador principia seu ensaio, uma jornada filosófica não em busca do sentido da vida, mas a clarividência de que não há sentido;

2 - Por isso numa breve apresentação não dada como tal, o autor esclarece aos leitores adentrantes ao texto de que suas páginas "tratam de uma sensibilidade absurda" encontrada esparsamente no século, e "não uma filosofia absurda que o nosso tempo, para dizer com propriedade, não conheceu". Deixa claro então que o absurdo até ali visto como conclusão, é considerado por ele "um ponto de partida", um ponto de partida que explicitamente e acima de tudo procura rechaçar qualquer metafísica, "nenhuma metafísica, nenhuma crença está presente aqui" afirma Camus;

3 - Tal afirmação desde já reforça ponto central do ensaio, o afastamento do autor das visões existencialistas e dotadas de alguma esperança e alguma metafísica tão vigentes em seu tempo. "certos espíritos contemporâneos". Quando as cita, como textualmente a náusea de Sartre, o faz nas aproximações, mas especialmente naquilo que se distanciam antagonicamente. A partir dessa transparência para com o leitor e para consigo no ensaio, Camus traça a sua jornada pela lógica do absurdo;

4 - O suicídio surge então como ponto importante para o desfiar da meada filosófica de Camus enquanto tema do ensaio "justamente [por] essa relação entre o absurdo e o suicídio, a medida que o suicídio é uma solução para o absurdo". Logicamente, não temos aqui uma obra sobre o suicídio e sua lógica, mas sobre o absurdo, afinal, o que é o absurdo, quais as linhas estruturantes do absurdo, o absurdo nos é dado? enfim, Camus olha para a vida e não passa a procurar seu sentido, desnuda, desvela, faz cerrar as cortinas do absurdo que é a vida;

5 - Para tanto, o autor ao mesmo tempo que apresenta suas conclusões sobre o absurdo, o faz mergulhando em uma vasta fonte de discussões e debates, especialmente dos olhares existencialistas, pois no decorrer do ensaio fica presente ao leitor que para constituir o absurdo Camus passa então a refutar com exímia argumentação diferentes raízes filosóficas, em especial as existencialistas; Percorre ainda os mitos, as lendas e a própria literatura para alicerçar com firmeza suas observações;

6 - Aliás, Camus adentra às relações entre filosofia e literatura, mais especificamente o romance e a filosofia. O autor pergunta-se "é possível uma obra absurda?" e a partir dela passa a abordar as aproximações e os distanciamentos entre estes dois campos de pensamento tão relevantes na constituição das sociedades humanas. Para ele, então "a obra absurda exige um artista consciente dos seus limites e uma arte em que o concreto não signifique nada além de si mesmo" e para além de outras reflexões, uma deveras relevante de que "a criação romanesca pode oferecer a mesma ambiguidade que certas filosofias..."

7 - Tanto que, no próprio ensaio teremos tais observações postas em prática, visto que autores como Dostoiévski e Kafka são tratados pelo pensador. A literatura em todo o ensaio assumirá papel relevante em sua análise do absurdo, e quanto a própria literatura, ele procura a observar até que ponto do absurdo determinadas narrativas alcançam e até que ponto, a despeito do aparente absurdo capitulam perante à metafísica e à esperança vã;

8 - Logicamente é preciso dizer que se trata de leitura densa, dessas que cobrar-nos-á algumas leituras e revisitas ao texto. Camus trata da falta de sentido, mas acima de tudo não uma falta de sentido que faça-nos como na maioria das vezes fitar o abismo em desespero. Podemos estar enganados, mas nosso entendimento leva-nos a crer que a lógica seja justamente contrária, compreender o absurdo, perceber o absurdo é agir sobriamente diante do abismo, diante do absurdo que caracteriza a curta e absurda existência do indivíduo no tempo. Perceber o absurdo que é constituinte da existência seja talvez embriagar-se de forma ébria;

9 - Camus fecha então o livro revisitando o mito dá o título de seu ensaio. O castigo infernal, então, de algum modo é pervertido pelo pensador "já devem ter notado que Sísifo é o herói do absurdo" diz Camus, "este mito só é trágico porque seu herói e consciente". De certa forma ao nos chamar à consciência do absurdo Camus pretende-nos todos Sísifos consciente de modo que façamos de nosso tormento nosso triunfo; 

10 - Enfim, para quem curte jornadas filosóficas ou mesmo que queira adentrar às questões da filosofia e da literatura, essa é bibliografia fundamental. Mas para além disso, o livro é um convite tenso e denso para olhar a natureza da vida, pergunta tão cara à filosofia. Para Camus é o absurdo. Compreender então o absurdo da existência é a busca mais interessante a se fazer no decorrer dessa análise de Camus.

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