10 Considerações sobre Em defesa do tempo, de Jenny Odell ou descobrindo uma vida além do relógio

O Blog Listas Literárias leu Em defesa do tempo - Descobrindo uma vida além do relógio, de Jenny Odell publicado pela editora Fontanar; neste post as 10 considerações de Douglas Eralldo sobre o livro, confira:

1 - O que é  tempo? seria talvez a pergunta mais imediata que os leitores poderiam se perguntar antes da leitura desta obra, isso porque provavelmente todos nós estamos muito marcados e influenciados por noções dominantes constituídas pela sociedade Europeia e seus moldes de colonização do mundo; todavia, com a leitura feita, compreendemos que a pergunta mais assertiva seria que noções de tempo existem? coexistem? como tais noções implicam em como lidamos com tal artefato que a despeito do que parece, é muito mais impreciso e não exato do que nos fez crer a vã filosofia do capital? Cremos que estas perguntas e hipóteses nascentes dessas possíveis perguntas traçam a jornada de Odell nesta obra;

2 - Neste livro Odell propõe-nos uma reflexão sobre o tempo e o que fizemos dele. Mas não se trata tão somente de uma obra sobre o tempo, pois talvez em paralelo ou mesmo acima, o que sustenta  texto ensaístico da autora é a relação humana com o cosmos, um cosmos do qual somos integrantes, não proprietários absolutos e onipotentes como se fez parecer nos últimos séculos com as revoluções técnicas. Impactada por uma pandemia que alterou nossas percepções e com a angústia esperançosa de que para para observar a paisagem em declínio, Odell, a bem da verdade, procura entender em que ponto do tempo estamos;

3 - Isso significa dizer que a partir das experiências pessoais somadas a uma vasta erudição bibliográfica, a autora no decorrer do livro levanta pontos e questionamentos ao modo como lidamos, compreendemos e experienciamos os momentos vividos. É nesse sentido que evoca as distintas compreensões do tempo e das influências destas sobre nossas posturas;

4 - Nesse aspecto há de se dizer que um alvo está bem nítido quanto à crítica da autora. O tempo cronometrado, conquista da precisão e do mundo do trabalho e do capital em que o poder é exercido e habita quem compra o tempo de quem, Odell analisa as falsas emergências e o modo como o tempo dos cartões-ponto, das horas de trabalho, apropriam-se de corpos - não apenas dos corpos humanos - e condicionam, os aprisionam, etc;

5 - De acordo com a autora, o que os leitores encontrarão em seu livro "são ferramentas conceituais para refletir sobre como seu próprio tempo está relacionado com o tempo que se vive". Essa proposta, aliás, é cumprida na jornada de leitura por suas páginas, pois ela de fato nos enriquece com um bocado de ferramentas que nos auxiliam nos tratos conceituais relacionados a como compreendemos o tempo e como isso também está marcado pelo tempo que vivemos;

6 - Para a autora, "uma verdadeira reflexão sobre a natureza do tempo, desvinculada de sua encarnação capitalista cotidiana, revela que nem nossas vidas nem a vida do planeta estão predeterminadas. Nesse sentido, a ideia de que podemos defender o tempo - recuperando sua natureza irredutível e inventiva - também pode trazer nossa salvação". Nesta pequena e breve afirmação, o que a autora efetivamente faz é justamente tentar libertar o tempo de seus distintos sequestros e sequestradores;

7 - Justamente por isso, a obra começa perguntando-se tempo de quem, dinheiro de quem? Nesse capitulo de forte pegada marxista, a autora descreve o tempo enquanto punição fortemente marcado e controlado pelo cristianismo, pelo capitalismo e pelas óticas de vigilância e controle que vemos nas ideias de Taylor e Bentham fortemente carregadas ao mercado de trabalho. O impacto dessas noções de tempo nos leva que "agora não é só o empregador que vê você como 24 horas de tempo de trabalho personificado; é isso que você vê também quando se olha no espelho";

8 - A bem da verdade é que em grande parte o livro procura nos mostrar o quão arraigada e o quão difícil é escapar desse aprisionamento a partir das concepções consumistas e capitalistas do tempo, justamente por isso, cremos que ela traz com muita riqueza sua tentativa de "devolver o tempo ao lugar dele". Ela o faz por meio de muitas fontes e distintas possibilidades de interpretação e compreensão do tempo. Mais do que isso, ela nos convida a olhar em outras direções, e conceber o tempo em sua distintas variáveis, algo, inclusive, que ela procura fazer na estrutura do livro quebrando, ainda que timidamente a linearidade da leitura, ofertando-nos janelas de escape a cenários vivos e cheios de tempo;

9 - Aliás, há muitas referências teóricas e culturais da abordagem do tempo, contudo, no decorrer de nossas leituras, outras diferentes noções e obras acerca da questão foram nos saltando às vistas, caso, por exemplo, do filme Contra o tempo (2011) que encena com grande habilidade uma sociedade radicalizada na concepção de que tempo é dinheiro, foco da contra-argumentação da autora. Além disso, dentre outras referências, cremos que Odell teria achado deveras interessante o poema ácido "O relógio", de Mário Quintana;

10 - Enfim, Em defesa do tempo não se trata de uma obra de auto-ajuda em que te traz dicas de como encontrar mais tempo para vender mais tempo para encontrar mais tempo para vender mais tempo para encontrar mais tempo para vender mais tempo para encontrar mais tempo... pelo contrário, a própria autora deixa isso bem claro, não temos uma obra corporativa de otimização do tempo, mas justamente uma proposta de resistência a essa concepção - hoje quase hegemônica - de tempo, e sim, olharmos em todas as direções que o tempo e a existência nos permitem. Como aprendemos com o livro, não á um cordão que puxado adiante o tempo - ou o controle de Click (2006)... ou seja, não nos aprisionemos apenas ao relógio, compreender o tempo vai muito além dessas maquinarias, essa é um dos grandes convites da obra.

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