Ai de mim! 10 considerações sobre O planeta dos macacos, de Pierre Boulle

 O blog Listas Literárias leu o clássico romance de ficção científica O planeta dos macacos, de Pierre Boule publicado pela editora Aleph; neste post as 10 considerações de Douglas Eralldo sobre o livro, confira:

1 - O planeta dos macacos era um destes livros que há algum tempinho estava na minha lista de leituras a ser feita, já que a ficção científica é um dos gêneros de interesse. Publicado originalmente em 1963 a narrativa do escritor francês Pierre Boulle se consolidou no imaginário social com suas adaptações para o cinema, um tanto diferentes da narrativa literária, questões que entre outros elementos serão tratadas nesta avaliação...

2 - Aliás, nesta edição mais recente da Aleph (2020) encontramos material extra que dentre outras coisas acaba centralizando em debates sobre a icônica imagem final do filme, aquela com a estátua da liberdade. Inclusive dando conta das reticências do próprio Boulle quanto à escolha. Neste material extra encontramos uma entrevista com Boulle, um texto de Hugh Schofield para a BBC e posfácio de Bráulio Tavares que ampliam nossas observações sobre a obra;

3 - Dito isso, partimos para o que importa, nossa leitura e interpretação e com aquele tradicional desafio de não chover no molhado quando se trata de obras já tão conhecidas do público, ainda que, desconfiamos, há mais conhecedores deste universo pelos filmes que talvez pela obra literária, desconfiamos. Neste texto trataremos, obviamente, do livro em suas principais concepções;

4 - O mote, obviamente, foi mantido pelos primeiros filmes, dando conta de viagens espaciais e da chegada destes viajantes em um planeta ermo - nesse caso planeta Soror como nomeado pelos astronautas que aportam neste mundo em que os símios dão as cartas. Presente e premente na temática abordada e que transparece no decorrer da narrativa o medo que obras distópicas e de sci-fi reservam à simplificação das coisas, especialmente das linguagens e das artes e nos cenários desastrosos que se podem gerar a partir disso;

5 - Todavia, antes de tratar um pouco mais do que ocorre no planeta dos macacos, é importante ao leitor observar as estruturas estéticas e narrativas construídas por Pierre Boulle estabelecidas em tempos distintos. Os leitores são apresentados inicialmente a duas figuras supérfluas e marcadas por certo hedonismo, Jinn e Phyllis que singram pelo espaço à toa na vida quando encontram vagando perdida pelo espaço uma garrafa de vidro. É nesta garrafa que está a narrativa dentro da narrativa...

6 - A narrativa contida na garrafa é escrita em primeira pessoa pelo jornalista Ulysse Mérou que participa de uma expedição e então passa a contar de forma assombrada sua experiência terrificante num estranho planeta em que os seres humanos comportam-se como animais e que na escala da evolução os símios constituem a ordem social vigente com sua cultura e linguagem. Toda a narrativa de Mérou, uma espécie de Hans Staden, só que ficcional relata sua prisão e sua relação com os símios até conseguir comprovar a estes que seu invólucro, seu corpo é constituído de espírito - alma...

7 - Eis aí uma das dialéticas da ficção científica de acordo com o pesquisador do tema Adam Roberts. O planeta dos macacos assim como quase toda obra do gênero ergue-se entre as questões científicas e as de naturezas espirituais, tanto que a Ulisse Mérou dois são os fatores que nos distinguem enquanto humanos, a linguagem e especialmente o fato de nossos corpos naturais serem habitados pelo espírito, pela alma. talvez residindo aí o maior assombro em encontrar macacos dotados de alma...

8 - Aliás, impossível deixar de observar em Mérou as fortes marcas do colonialismo europeu. Lembremos que a ausência de alma de espírito fora uma das razões das expedições colonizadoras, que diante novos povos, sempre foram incapazes de conceber anima ou alma dentro desses primitivos bárbaros. Talvez esse seja um dos principais problemas de conceituação da obra, marcado por tal falta de racionalidade na compreensão de nossos aspectos naturais e carentes da existência de espírito. Esse detalhe é muito marcante em Ulisse e a bem da verdade toda a ciência dele e do planeta Soror é alicerçada nesta perspectiva;

9 - Além disso, a narrativa mantém características de um acerto que a ficção científica ainda terá de fazer com o feminismo. A visão machista e misógina é presente como em muitas das obras do gênero. A mulher posta enquanto signo parvo e fútil é recorrente na ficção científica. No caso de O planeta dos macacos parece-nos ainda mais evidente, não apenas na relação de Mérou com Nova como com a macaca Zira. Aliás, a maternidade como legitimação do feminino como veremos na narrativa é mais um de seus aspectos problemáticos - e reforçamos, não somente dele, mas como de todo o gênero e suas principais obras;

10 - Dito isso, podemos encerra dizendo que O planeta dos macacos ao cabo mostra-se mais forte pela aventura e pelo exotismo da experiência que propriamente pelos elementos do gênero ficção científica. Há de se ponderar também, especialmente no que falamos do tratamento feminino na narrativa, que é uma obra de seu tempo e seus próprios olhos, e assim devemos julgá-la. Ainda assim, urge tal discussão sobre como o gênero observa ou observou os protagonismos femininos. Cabe destacar ainda que talvez a força da narrativa esteja em suas escolhas pelo efeito, tal como se buscou com a Estátua da Liberdade no filme. Bem verdade que certo efeito tentado na narrativa dentro da narrativa - a de Mérou de certo modo é um tanto previsível, o que não pode-se dizer o mesmo da última parte, do último parágrafo do livro, capaz de surpreender seus leitores. Uma boa leitura.

:: + no Submarino ::



Postar um comentário

Postagem Anterior Próxima Postagem