10 Considerações sobre O último presente de Paulina Hoffmann, de Carmen Romero Dorr ou sobre mensagens emancipatórias

O Blog Listas Literárias leu O último presente de Paulina Hoffmann, de Carmen Romero Dorr publicado pela editora Jangada; neste post as 10 considerações de Douglas Eralldo sobre o livro, confira:

1 - Fragmentado em diferentes tempos e em duas gerações de mulheres envoltas não apenas com segredos, mas também com a existência marcada pela resistência às adversidades que as assombram, O último presente de Paulina Hoffmann trata de fantasmas existenciais tendo como pano de fundo o pós-trauma da guerra e seus horrores;

2 - Nesse sentido, a fragmentação do tempo surge exatamente para interligar presente e passado por meio da neta, Alicia, e a avó, Paulina Hoffmann, que ao falecer deixa como herança uma desconhecido apartamento em Berlim, criando assim o evento que levará a jovem neta a não só avaliar a própria vida como fazer descobertas a respeito de uma avó, que a despeito da intimidade que tinham e compartilhavam, escondia ainda uma porção de segredos acerca de si;

3 - A bem da verdade tais fragmentos temporais surgem como uma estratégia de narrar por meio de flashbacks quando o narrador retrocede a diferentes momentos da vida, um pouco da de Alicia, mas basicamente de Paulina quem parece centralizar a narrativa, pois que é sua história que reverbera por todo o romance;

4 - Assim, se ordenássemos de forma linear os acontecimentos, o romance narra acontecimentos a partir de 1945 e os horrores da Segunda Guerra Mundial. Das amizades tornadas proibidas pela política atroz e tirana e aos desígnios sombrios dos moradores de uma Berlim flagelada pela guerra as dificuldades que esta impunha à cidade, como a carência de tudo, não apenas produtos, alimentos, mas também carência de humanidade, o que não melhora de modo algum ao final da guerra;

5 - Deste modo a família de Paulina, ainda que não de todo adepta ao nazismo, é cortada por ele, que leva-lhe parte por diferentes meios e modos, restando ao fim do conflito apenas ela e a mãe. A partir de então as duas resistem aos horrores que prosseguiram após a Guerra mostrando força e resistência, bem como abnegações capazes de cobrar alto preço, como no caso da mãe de Paulina após as duas terem conseguido migrar para a Espanha e viver com parentes;

6 - Mas isso não as salvou das tragédias a teimar a atravessar a história das duas, como se a salvação fosse sempre uma impossibilidade. Como se não tivessem o direito a qualquer felicidade, um jogo que amplia-se com os destinos atrozes que vão cruzando pelo caminho da jovem Paulina, da Paulina mulher, etc.;

7 - Isso faz com que o tensionamento e a dramaticidade do livro seja uma constante. Paulina precisa conviver com tantos revezes em sua trajetória que é como se ela fosse impedida de alcançar a felicidade de tal modo que quando parece encontrar qualquer estabilidade, ela é desfeita por linhas tortas de um destino bastante cruel. Com isso Paulina monta-se como uma sobrevivente, uma sobrevivente que fará escolhas difíceis e talvez condenáveis, o que demandará ao leitor certo julgamento;

8 - O mesmo ocorre com a neta, também atravessada por tragédias pessoais, especialmente a perda da mãe e a incompatibilidade com a vida em família e o casamento que erode. Isso faz de Alicia uma pessoa que com a inesperada herança da avó encontra uma oportunidade de tentar encontrar a si mesma;

9 - Todavia, vale dizer que se postos em comparação, os dramas de Alicia podem soar um tanto exagerados se comparados aos acontecimentos com a avó. Seu desgosto com as coisas e a forma melancólica de encarar a vida às vezes soam com certo pedantismo o que em muitos momentos leva-lhe a uma autocomiseração um tanto exagerada. Ainda assim, tal como a avó, ela guarda em segredo escolhas que a incomodam, que a assombram, daí que o presente, o último da avó, e não estamos falando de um apartamento;

10 - Enfim, embora com personagens fortes e certo signo de resistência a partir do pano de fundo dos traumas e escolhas de duas vidas marcadas por tragédias e desencantos, é narrativa de ritmo lento, de atmosfera carregada, e ainda que com muitas virtudes, por vezes soa-nos certo exagero as coisas que se atravessam a uma só vida. No mais, é narrativa que trata de fibra e perseverança feminina.



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