10 Considerações sobre Tentativas de Fazer Algo da Vida, de Hendrik Groen ou porque, enquanto houver planos, há vida

O Blog Listas Literárias leu Tentativas de Fazer Algo da Vida, de Hendrik Groen, publicado pelo selo Tusquets da editora planeta; neste post as 10 considerações de Douglas Eralldo sobre o livro, confira:

1 - Tentativas de Fazer Algo da Vida é uma obra sutil que penetra por questões caras e nem sempre abordadas pela sociedade e discute principalmente o papel dos idosos em nosso mundo ao mesmo tempo que com um texto sarcásticos que alterna entre acidez, crítica feroz e um dose de humor letárgico numa obra que ao falar da velhice avança fortemente sobre as incongruências e as práticas de uma civilização cada vez menos humana;

2 - Além de seu conteúdo de qualidade, o livro guarda-se em mistérios ao nos apresentar um narrador-autor-protagonista que sob o pseudônimo de Hendrik Groen, um senhor observador de 83 anos e meio e sobre o qual pouco se revela, e que nos narra o dia a dia em uma casa para idosos, mas que contudo, com seu olhar crítico permeado de ironia,sarcasmo e humor, parte do micro para o macro construindo não só um tratado sobre envelhecimento, mas também sobre como a sociedade de comporta quanto a isso;

3 - E mesmo que o faça com distinção e classe, o narrador não envereda pela poética, pois seu textos condizente ao relato pessoal dos diário transpassa justamente a sensação de um idoso que resolve escrever sobre a vida, ainda que pouco revele da sua, o que se explica por sua personalidade. Assim, com uma simplicidade elegante e verossímil não é a estética que dá o tamanho da obra, mas sim o conteúdo da qual trata e com muita qualidade e reflexão que vai saltando a partir das nuances e das ironias do romance-diário;

4 - E o cenário que Groen nos narra é de fato perturbador, pois em sua visão lúcida sobre a velhice ele joga a questão na pauta, trazendo com isso não só os aspectos físicos do envelhecer, os dramas e as tragédias pessoais, mas quiçá uma problemática muito maio, a ausência ou os equívocos de um mundo cuja expectativa tem crescido, mas que não tem se preparado para essa nova realidade conquistada;

5 - Talvez mais assustador ainda sejam os lembretes do próprio autor que em seu diário quando da críticas não esquece-se dizer que mesmo suas realidades de abandono e esquecimento passa-se num dos países conhecidos pela qualidade de vida e por ser de primeiro, a Holanda, e mesmo assim, Groen expõe o tratamento da casa assistencial, da própria sociedade e dos próprio políticos governantes em relação ao envelhecimento que é na verdade um grande golpe que chama a atenção se formos pensar comparativamente com países mais pobres;

6 - Para tanto, vale dizer que o diário se passa durante o ano de 2013 e nele está presente discussões a respeito de reformas holandesas como aconteceram em 2016 no Brasil. Assim, Groen além de crítico, mostra-se cético sobre as intenções dos políticos, além de em seu eruditismo escrever cronicas pouco otimistas do mundo ao longo de seu diário;

7 - Com diria Antonio Cândido, isto se dá porque este trabalho é uma testemunha de seu tempo, e como curiosidade,na obra veremos reflexões sobre diversos elementos de crise que tiveram princípio naquele ano e que vieram a eclodir em 2016, como a crise de refugiados, o crescimento da intolerância, as guinadas políticas, todas vindas à baila graças a um Henrik Gron informado e atento ao mundo que vive;

8 - Ainda assim, mesmo mergulhado em certa angústia o livro é uma espécie de resistência, como é o caso da própria decisão de escrever seu diário. Se em um 1984 Winston Smith escreve seu diário e resistência ao regime do Grande Irmão, uma resistência isolada, Groen o faz por motivo parecido, sua resistência isolada perante a desistência final, uma de suas tentativas de fazer algo da vida mesmo que em ambiente pouco amigável, e a partir disso as ações e as mudanças no dia a dia convergem para um dos conceitos finais da obra, enquanto houver planos, há vida;

9 - Com isso, numa obra extremamente realista e que acontecimentos põe em xeque os motivos inclusive de se tentar fazer algo, veremos um forte embate entre vida e morte, além de um convite sério e sem dogmas a se refletir sobre a eutanásia, questão que permeará boa parte do diário;

10 - Enfim, convincente e comovente, Tentativas de Fazer Algo da Vida é destas coisas que dá o valor de literatura, uma obra de relevância e que abre a porta para importantes reflexões e críticas, mas que acima de tudo demandará leitores corajosos e desprendidos que não tenham medo de peregrinar por um tema muito espinhoso. Meu conselho, se idosos, leiam e amplifiquem a voz de Groen, se jovens, leiam o quanto antes e talvez possamos melhorar nosso futuro e um pedaço do presente.



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