É possível classificar a leitura e a escrita de acordo com a faixa etária? que diferenças haveriam - se é que haveriam entre escrever para adolescentes ou adultos? Essa é uma questão de muitas propostas e revisões de ideias; no post de hoje selecionamos a visão de Ursula K. Le Guin, um dos maiores nomes da Ficção Científica, tratando sobre o tema num prefácio de O feiticeiro de Terramar. Confira:
1 - Será que escrever para crianças mais velhas era tão diferente de simplesmente escrever? Por quê? Apesar do que alguns adultos parecem pensar, os adolescentes são completamente humanos. E alguns leem com tanta intensidade e tanta dedicação que parece que suas vidas dependem disso - e, às vezes, dependem mesmo;
2 - O lugar, no âmbito da imaginação pura, é tão importante quanto aqui, no mundo real. Antes de começar a escrever a história, eu pequei um pedaço grande de cartolina e desenhei um mapa;
3 - Me alegro quando vejo obras de fantasia como sempre foram - como literatura - e reconhecidas como tal;
4 - A maior parte desta maravilhosa torrente de literatura (tradição das histórias de heróis e contos fantásticos) foi escrita para adultos, mas a ideologia literária modernista a relegou às crianças. E as crianças podiam nadar nessas águas (e o fizeram), felizes como se estivessem em seu elemento natural;
5 - As histórias não eram sobre mulheres; eram sobre os homens, o que os homens faziam e o que era importante para eles; (nesse sentido, O feiticeiro de Terramar era perfeitamente convencional; sob outros aspectos a minha história não segui a tradição)
6 - Fui deliberadamente furtiva em relação a eles (aos elementos subversivos na narrativa citada); Em 1967, um grande número de leitores brancos não estava pronto para aceitar um herói de pele escura;
7 - Minha imaginação se recusa a limitar aos campos de batalha todos os elementos que constituem uma história de aventura e a tornam emocionante - o perigo o risco, o desafio, a coragem;
8 - Um herói cujo heroísmo consiste em matar pessoas não me interessa, e detesto as orgias hormonais de guerra das mídias visuais;
9 - A guerra é uma metáfora moral limitada, limitante e perigosa. Ao reduzir as opções de ação a uma "guerra contra o que quer que seja", você divide o mundo entre Eu ou Nós (o Bem) e Eles (o Mal), reduzindo a complexidade ética e a riqueza moral da nossa vida a termos de Sim/Não;
10 - Quando a guerra é a única opção em jogo, sim: o poderoso se torna o certo. E por essa razão eu não gosto de jogos de guerra. Para ser o homem que ele pode vir a ser, Ged tem que descobrir quem (e o que) é seu verdadeiro inimigo. precisa descobrir o que significa ser ele mesmo. Isso exige busca e descoberta, não guerra.
Fonte:
LE GUIN, Ursula K. O feiticeiro de Terramar. Arqueiro: São Paulo, 2016.