10 Considerações sobre Anne de Avonlea, de L. M. Montgomery ou sobre tempos de mudanças

O Blog Listas Literárias leu Anne de Avonlea, de L. M. Montgomery publicado pela editora Autêntica; neste post as 10 considerações de Douglas Eralldo sobre o segundo livro com as aventuras de Anne Shirley[aqui Anne de Green Gables], confira:

1 - Em Anne de Avonlea L. M. Montgomery dá sequência às aventuras da travessa e cativante Anne Shirley; mas se em Anne de Green Gables somos apresentados a essa menina ainda criança, cheia de travessuras, encrencas e trapalhadas, neste segundo livro, que marca uma espécie de transição entre infância, juventude e a vida de adulto que no fim se pronunciará em promessas, temos uma Anne menos envolvida em trapalhadas, pois é agora uma jovem e responsável professora, contudo, o que não significa abandono da poesia e da forma poética e cheia de imaginação tão característica à Anne. Isso também não significa que não hajam acontecimentos hilariantes tão presentes na rotina desta garota;

2 - Aliás, é bem interessante como Anne nos coloca duas formas distintas de se enfrentar as coisas. Marcada pela sua positividade e pelo seu alto teor imaginativo e capacidade de "romancear" a vida observando-a por seus aspectos positivos, por meio de Anne, Montgomery fala de prosa e poesia. A prosa destinada àqueles com os pés fincados ao solo, com olhos que procuram sempre por algo "real", mais duro, enquanto a poesia, modo de encarar a vida e os acontecimentos de uma forma um tanto mágica e pela qual poucos são capazes de observar, caso neste livro de Anne, Paul Irving e a senhorita Lavendar. Para Anne a vida é uma poesia, uma poesia capaz de encontrar poesia nas pequenas e grandes coisas de cada novo alvorecer. Não podemos negar que há algo de edificante nisto;

3 - Há de se considerar, claro, o contexto e o lugar de produção da narrativa. Publicado no Canadá na primeira década do Século XX a série com as aventuras de Anne Shirley falam de seu tempo, um tempo para nós já um tanto distante. Isso, claro, será percebido ao longo da narrativa, seja por certa ingenuidade ainda presente num mundo menos complexo, seja pelas contextualizações de determinadas abordagens, como a pedagogia, que nos fica evidente tal distanciamento. Todavia, no que se refere à alma da natureza humana, seus valores condutas, veremos que a narrativa ainda nos pode ajudar um bocado;

4 - Falando em pedagogia, creio que ela nos mereça certa atenção especial, pois que parece-nos que a filosofia da jovem professora Anne é mais um reforço de como em alguns traços e ideais o romance parece estar um tanto a mais a frente de seu tempo. É nesse sentido que se faz muito interessante a observação de como Anne compreende e entende o ensino e a educação. Mais do que isso, descontando suas pequenas ambições, desejos e idealizações, no seu fazer e especialmente no seu teorizar educacional, a jovem professora, como fica meio que claro pelas manifestações da própria comunidade, é bastante progressista em sua forma de compreender e praticar a educação;


5 - Não que o contexto a que está inserida a narrativa não atravesse as teorias de Anne. Entre o progressismo de seu discurso teórico e a realidade prática, há um pequeno ruído, ou decaída, que fará Anne questionar sua própria teoria. Entretanto, mais interessante é o fato de que Anne de certo modo não destrói a pleno sua teoria, já que fica claro que quando ela trai seu próprio discurso acaba fazendo-o mais pelas fraquezas humanas que por falha da teoria;

6 - Outro elemento muito interessante que por vezes pode ficar oculto pelo romantismo visionário da narrativa é o retrato dos comportamentos humanos e sociais na pequena Avonlea que são trazidos à luz por Montgomery. As pequenas idiossincrasias, contradições e personalidades de um lugar ermo e bastante comunitário são trazidos à tona. Isso pode ser melhor percebido pelas diferentes relações que se estabelecem inicialmente com a Sociedade Para Melhorias de Avonlea liderada por Anne e Gilbert;

7 - Por outro lado, se em prosa talvez vejamos os problemas em muitos dos comportamentos em Avonlea com seus pequenos estresses, intrigas e mesquinharias, pela poesia somos capazes de perceber que talvez esteja aí de fato uma comunidade, uma comunidade que a despeito de suas individualidades, cada qual com seus propósitos e interesses, ainda assim uma comunidade. Nesse aspecto, mas uma vez talvez a Sociedade Para Melhorias sirva de exemplo, pois a despeito da desconfiança inicial, a semente acaba frutificando;

8 - Vejamos que até agora não tratamos sobre o período de transição que acaba representando o livro. Dois anos agitados na vida de Anne, ainda em Avonlea e morando em Green Gables com Marilla e um casal de gêmeos que acaba sendo adotado por elas. É um período de amadurecimento e ao passo que a narrativa avança para sua parte final, vai revelando-se um processo com muitas mudanças, mas também com acontecimentos ao melhor estilo Anne;

9 - Assim, se teríamos algo a questionar sobre a narrativa - e aqui mais uma vez considerando seu contexto - é o papel tão central que a beleza e os aspectos físicos parecem conduzir Anne, também certa resignação em Diana. Há o olhar de seu tempo marcado por certo asco aos aspectos físicos não modelares, o que acaba contrastando - mas só um pouquinho - com a doçura de Anne Shirley;

10 - Enfim, divertido e com muitas qualidades e elementos de interesse, Anne de Avonlea é um convite a olhar, ler e interpretar o mundo e as coisas de forma poética. Uma narrativa que fala do poder da imaginação, e ao cabo traz exemplos das pontes que podem ser construídas com essa forma encarar a vida.

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