10 Considerações sobre História Medieval, de Marcelo Cândido da Silva ou sobre repensar a Idade Média

O Blog Listas Literárias leu História Medieval, de Marcelo Cândido da Silva publicado pela editora Contexto; neste post as 10 considerações de Douglas Eralldo sobre o livro, confira:

1 – História Medieval é interessante leitura introdutória à discussão histórica da Idade Média e que a seu modo procura também uma abordagem capaz de superar ou reorientar determinadas visões acerca deste importante período da história humana. A bem da verdade o autor procura ir além de definições herméticas e que vigoraram por certo tempo compreendendo tal momento apenas pelas sombras e pelo obscuro dos acontecimentos, pois de acordo com o autor “se não se pode negar a repressão a todas as formas de divergências doutrinária, filosófica que marcaram e criaram as condições de poder da Igreja [neste período], é preciso reconhecer que a Idade Média foi também uma época de expansão geográfica, política, econômica e cultural”;

2 – Nesse sentido o autor delineia já na introdução de seu texto sua visão do período, que como ele ressalta, é bastante distinta entre os autores. Para Silva “nem tempo de decadência, nem época de ouro. A Idade Média foi um período de grandes contrastes, em que a fome, a peste e as guerras se alternaram com a paz, a prosperidade e abundância, e no qual o universalismo do Império e o do Papado conviveram com os particularismos senhoriais e com as monarquias em vias de centralização”;

3 – É justamente a partir destes contrastes que o autor acaba discutindo nos capítulos da obra, focando em “O mundo romano e os reinos bárbaros”, passando pela questão “A dominação senhorial”, tratando da “Igreja e sociedade” e discutindo suas “Crises e renovações” até o fechamento com “A fabricação da Idade Média” quando aborda o tratamento moderno e contemporâneo deste período, visto em alguns grupos por espelhos míticos, que em alguns casos trazem impactos inclusive ao presente conturbado;

4 – No capítulo “O mundo romano e os reinos bárbaros” o autor procurará mostrar que “a Europa medieval nasceu do mundo romano, ou melhor, das transformações que esse mundo experimentou graças às migrações bárbaras, à difusão do cristianismo, à descentralização do poder político e ao fortalecimento da aristocracia rural”. Neste capítulo será interessante como Silva observa e desconstrói alguns elementos popularizados, especialmente quando trata dos bárbaros, especialmente do termo “invasões bárbaras” que ele procura analisar em diferentes perspectivas;

5 – Este olhar que procura discutir e debater diferentes perspectivas, acontece, por exemplo, quando em vez de ficar discutindo o feudalismo opta por uma discussão mais ampla a tratar da dominação senhorial no período. Segundo ele “o que caracteriza esse período são as relações de dominação que se estabelecem entre, de um lado, os senhores de terras e, de outro, aqueles que nelas trabalhavam (os camponeses) e mesmo os que habitavam nas proximidades...” é o que ele chama de “dominação senhorial” e procura analisar em diferentes dimensões, econômica, social, cultural etc.;

6 – É por essa análise abrangente que o autor acaba optando pelo termo “dominação senhorial” e vendo-o como mais apropriado que o termo “feudalismo” que na ótica do trabalho um tanto mais restrito a determinadas franjas populacionais. Argumenta, inclusive, que a relação mais íntima entre feudalismo e violência, contrastada com a amplitude da dominação senhorial um tanto ambivalente;

7 – Já no capítulo “Igreja e sociedade” Silva nos mostra que “por meio de suas normas, seus dogmas e seus ritos, a Igreja forjou alguns dos principais traços das sociedades europeias a partir do século IV”. Isto junto de toda uma forte argumentação estabelecida leva ao autor dizer que “a principal característica do período medieval é a identificação da igreja com o conjunto da sociedade” algo que para ele ocorre mesmo antes da afirmação hierárquica da instituição. Neste capítulo o autor trata de um dos temas sempre procurados por interessados no período medieval, as cruzadas, eventos que ele trata com a mesma amplitude de perspectivas e visões;

8 – No penúltimo capítulo do livro, “Crises e renovações” o livro mostra que “os séculos XIV e XV, na Europa Ocidental, foram palco de acontecimentos que aparentam marcar o colapso da ordem medieval: é o caso da crise do Papado, da Guerra dos Cem Anos, das crises alimentares, da peste entre outros”. Assim como nos demais capítulos o autor procura por e contrapor diferentes argumentos e trazendo uma visão ampla aos fenômenos, o que lhe possibilita inclusive a propor que “não é um equívoco afirmar que o mundo moderno começou a se constituir na Europa medieval, a partir do século XII”;

9 – E finalmente no último capítulo, Silva observará “A fabricação da Idade Média” a partir dos olhares que a sucederam. Mostrará sua popularização nas últimas décadas, discutirá o papel da cultura e das artes nisso. Além disso, “mais do que uma evocação dos séculos medievais para uma afirmação cultural ou identitária, assistimos, ao longo do século XIX e, principalmente, do século XX, a usos deliberados daquele período com fins políticos”. Aliás, essa é uma questão do livro que faz convite a uma discussão ampliada e profunda.

10 – Enfim, História Medieval é rica e boa fonte de pesquisa introdutória a que se interesse pelo período medieval. Mesmo nessa abordagem uma panorâmica enquanto introdução, ela possibilita-nos uma olhar para o período que supera algumas visões compartilhadas pelo imaginário comum, em parte moldado pelos interesses políticos e culturais. Assim o livro traz uma perspectiva e uma abordagem mais voltada a uma Idade Média real e, não apenas mítica; o que para o interessado em história é uma boa entrada a estudos que permitem uma observação menos fechada da história.



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