10 Considerações sobre O Fogo Invisível, de Javier Sierra ou sobre lutar contra Os Frustradores

O Blog Listas Literárias leu O Fogo Invisível, de Javier Sierra publicado pela editora Planeta; neste post as 10 considerações de Douglas Eralldo sobre o livro, confira:

1 - Entre o thriller conspiratório e a fantasia, O Fogo Invisível mergulha no universo da criatividade e da inspiração tratando de como nascem as narrativas e os mitos numa jornada a la O Código da Vinci em que a procura por algo misterioso e secreto levará seus protagonistas a perigos intensos numa jornada frenética e intensa até seu desfecho um tanto onírico quanto a literatura;

2 - Aliás, a citação de O Código não é gratuita, pois na própria narrativa sobre as narrativas irá trazê-lo para discussão, inclusive falando de seus valores enquanto fala das tantas emulações do romance de Dan Brown, a qual esta própria publicação não deixa de ser uma de suas derivações, só que aqui, embora os mistérios e os segredos muitas vezes percorram caminhos semelhantes, as busca final contudo será outra que não simplesmente um graal físico;

3 -  A bem da verdade, a busca a que o protagonista, o linguista David Salas, é levado a participar acaba misturando o mito do graal a uma caçada aos princípios da inspiração e de criatividade de grandes gênios da arte humana surgindo daí este fogo invisível que impulsiona as grandes inspirações, mas que também atrai grandes inimigos que tentam coibir essa inventividade, chame-os de Daimones, Frustradores ou outras figuras etéreas e sombrias que gerações diferentes de escritores já falaram;

4 - Essa mescla, contudo, acaba construindo uma narrativa um tanto díspar quanto sua primeira metade e sua parte final. No princípio, a narrativa soa-nos bastante metaliterária e metalinguística com seu discurso teórico e acadêmico incorporado aos personagens, claro que de modo natural pois são os personagens ilustres figuras acadêmicas. Nessa primeira metade introdutória teremos talvez abordagens mais lúcidas acerca da escrita, e às vezes de forma periférica d'outras artes;

5 - No entanto, ao avançar da aventura, quando já longe da Irlanda, onde mora Salas, e na sua terra de origem, a Espanha, ao passo que é levado para dentro de um misterioso e seleto grupo coordenado pela escritora Victória Goodman que está numa busca pelo graal e sua relação com a criatividade de grandes escritores, não só o romance, mas também o protagonista se verá cada vez mais envolvido no meio de uma trama cheia de segredos e conspirações;

6 - A partir de então o livro passará cada vez mais a exibir cores esotéricas e místicas, e isso de toda forma acaba diferenciando-o da grande maioria dos romances conspiratórios, que embora tratem das mais diferentes e criativas conspirações, em seus desfechos finais parecem não crê-las de fato. Não é  o que acontece neste romance, ao fim mais crente e místico que nunca, o que talvez acabe nublando a a realidade dos processos criativos e literários tornando-os sublimes e míticos para além da construção humana, reforçando com isso que a escrita literária estaria numa jornada transcendental. Proposta essa que acaba carregando suas problemáticas e polêmicas;

7 - Todavia se temos tais reflexões a ponderar, embora limitada pela perspectiva de Sala e partes de diários de terceiros, enquanto thriller, o romance é efetivo em seu ritmo e ação, de modo que nesses aspectos estruturais persegue os ditames do gênero, dos quais se afasta apenas quando lega para o místico o que geralmente nos thrillers encontramos pelo olhar realista: o desfecho final;

8 -  Além disso, vale dizer que embora distintos, os personagens acabam caminhando ou percorrendo soluções já conhecidas do gênero, o que a seu modo apresenta-nos algumas previsibilidades enquanto soluções e desfechos menores dentro da narrativa, pois ainda que guarde suas propriedades particulares, em geral a obra se assemelha muito com as demais do gênero, especialmente pós O Código da Vinci, que parece ter criado certo padrão para estas narrativas;

9 -  Agora, vale dizer para fãs de literatura e curiosos pelo processo criativo, especialmente em sua primeira metade, os leitores encontrarão material interessante sobre esta bela arte, que ainda hoje está cercada de mistérios e imprecisões, aliás, o fato da imprecisão e da impossibilidade de definição é o que provavelmente faz da literatura algo ainda importante. Ademais, a narrativa, conforme a disposição e a profundidade do olhar do leitor, poderá chamar atenção para a construção coletiva dos mitos e como isso se dá não num tempo específico, mas numa comprida linha diacrônica de eventos e acontecimentos;

10 - Enfim, O Fogo Invisível é leitura curiosa, visto que ao aceitar a fantasia afasta-se do gênero, mas que por outro lado joga novos gravetos do fogo das dúvidas e mistérios envolvendo a arte de escrever. É como se nos dissesse que esta chama, que se embora invisível, ainda arde.



1 Comentários

  1. como leitor contumaz... este e o primeiro livro de Javier Serra que leio... gostei.. enxerga D Brown a distancia, mas quem sabe chegue perto... Boa sorte... foi uma boa leitura

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