10 Considerações sobre Middlesex, ou como desabrochar o açafrão

O Blog Listas Literárias leu Middlesex, de Jeffrey Eugenides publicado pela Companhia das Letras. Neste post a avaliação com as 10 considerações sobre o livro:

1 - Vencedor do Prêmio Pulitzer, Middlesex, de 2002, relançado em 2014 no Brasil pela Companhia das Letras é a confirmação do talento excepcional de Jeffrey Eugenides que surgiu para a literatura com o também excelente As Virgens Suicidas. Neste livro toda a qualidade do autor produz um romance digno de adentrar imediatamente ao campo dos grandes cânones literários por causa de sua trama impactante e narrativa primorosa;

2 - Em Middlesex, Cal, o narrador, percorre o tempo para contar sua própria história, hermafrodita que vivera até os catorze anos como menina, para então assumir a identidade de menino. Para contar isso é então necessário que essa viagem pelo tempo percorra a história de sua família, bem como histórias de um mundo em conflito em que as pessoas estão em constante mudança. Assim, para justificar-se a si mesmo, Cal, retrocede no tempo revelando segredos da família Stephanides ao mesmo tempo que busca compreender-se;

3 - É por tanto um livro complexo. Complexidade esta que se faz necessária para esta construção tão realista que é a obra, que mais do que discutir o hermafroditismo, acaba de fato trazendo á tona questões de formação de gênero, degradação humana, além de também pela voz de Cal, talvez, em alguns momentos o próprio autor tecer teorias sobre determinados e conturbados momentos históricos;

4 - Desta forma, Jeffrey Eugenides viaja tal como seus personagens itinerantes, saindo de vilarejos em conflito entre turcos e gregos, chegando à América, perpassando por um importante desenvolvimento industrial às custas de trabalhadores robotizados por Henry Ford, aos conflitos raciais que inundaram de violência as ruas de Detroit, os anos 70, 80, enfim, é um livro que através da família Stephanides reconta um pouco da história recente;

















5 - Além disso, há ainda a polêmica sobre o incesto, uma tema que sempre rende grandes discussões, e que nesta obra é colocado de forma com que o próprio leitor vá tirando suas próprias conclusões;

6 - Mas acima de tudo o que faz de Middlesex uma das grandes obras da literatura mundial é justamente o talento e a capacidade que Eugenides tem em contar uma história, bem como a sua infinidade de recursos que demonstram que este é uma dos autores contemporâneos diferenciados e que certamente terá seu nome entre os que permanecem no tempo;

7 - E o elogio ao autor se justifica, por exemplo, pela sua forma narrativa e pelo domínio que o mesmo tem sobre sua obra, mesmo diante de tantas complexidades e vidas que se constituem ao longo da saga da família Stephanides;

8 - Outro ponto importante no que diz à técnica é a escolha e a constituição de um narrador que mesmo em primeira pessoa é portador de um estranha onisciência quanto aquilo que lhe foge do testemunho. Cal brinca e provoca o leitor, mas sempre deixando claro seu domínio sobre a trama que nos conta e os jogos narrativos que faz com o leitor. Infiel com toda narrativa em primeira pessoa, fica claro que o já homem adulto, Cal, Calíope até os catorze anos, mais do que contar-nos sua história, por meio de sua onisciência imaginativa acaba na verdade recriando sua própria existência. Ou seja, temos em Middlesex um narrador e uma narrativa dignos de estudos literários, cuja complexidade eloquente só é vista nas obras que transcendem a própria literatura;

9 - O livro em seu conjunto, embora o narrador, acaba sendo extremamente realista com pinceladas de certo impressionismo, visto que suas cenas são amplamente sensoriais. É um livro que ao mesclar fatos históricos e também se amparar em ciência acaba por praticamente se materializar diante do leitor impactando-o emocionalmente e fisicamente;

10 - Enfim, Middlesex é um clássico instantâneo, e certamente o tempo provará sua atemporalidade e o manterá no panteão dos grandes romances da literatura. É um livro para leitores exigentes e uma obra a ser discutida e pesquisada por muito tempo, e uma prova inconteste que a literatura recente é capaz de produzir grandes e eloquentes romances.



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