10 Considerações sobre Circe, de Madeline Miller, ou sobre deusas e feiticeiras

O Blog Listas Literárias leu Circe, de Madeline Miller publicado pela editora Planeta/Minotauro. Neste post as 10 considerações de Douglas Eralldo sobre o livro, confira:

1 - Circe traz protagonismo à feiticeira da mitologia grega, que embora presente na Odisseia e nas Metamorfoses, não é trabalhada ou conhecida tanto quanto outros deuses e guerreiros desta cultura, ainda hoje influente no caminhar humano. No romance de Madeline Miller Circe constitui-se como personagem forte aclara sua presença em eventos relevantes à mitologia em questão;

2 - Aliás, vale dizer que o romance não só traduz um posicionamento quanto ao resgate e fortalecimento desta personagem feminina, mas também acaba sendo uma introdução a muitos personagens e muitas histórias da mitologia grega, de modo que aos já conhecedores mais profundos do tema, terão uma perspectiva ampliada, e os iniciados poderão conhecer personagens tão marcantes da ficção e cultura humana;

3 - Para tanto, teremos um romance narrado pela própria feiticeira que resgatará de sua infância às pernas de seu pai, Helio, ao seu exílio na ilha de Eana, onde aprofunda seus poderes na bruxaria e onde se relacionará com Odisseu com quem terá um romance dando fruto a Telégono. A bem da verdade a narrativa linear procura não só apresentar as aventuras em que Circe têm participação relevante, mas também sobre suas próprias metamorfoses;

4 - Isso importa dizer que a narrativa de Circe constrói-se como alguém que vai abrindo os panos de uma cortina. Assim, ela parte de uma ingenuidade e ignorância sobre si mesma e o mundo a que pertence a um saber não apenas "mágico" com seu conhecimento das plantas e bruxarias, mas também de compreensão - um tanto humana - das coisas a sua volta;

5 - Deste modo a personagem, de séculos levando pancadas, passa a compreender com ceticismo e desconfiança as redes de interesses, seja de mortais, seja dos deuses e deusas do olimpo. Embora demore - em termos humanos e olimpianos talvez -, Circe começa aos poucos a descobrir os ardis, as tramas e os enganos da existência, inclusive do amor, o que a faz então uma personagem firme e dura o necessário para "sobreviver" num meio que tal como a vida, está cheio de perigos;

6 - Tudo isso, claro, com o sabor da literatura de fantasia e das narrativas que procuram dar agilidade aos acontecimentos numa prosa bastante melódica, mesmo quando nos momentos mais delicados à sua narradora, em em muitos momentos sucumbirá a dramas e tristezas, mão nunca deixando de enfrentá-los;

7 - Até porque, tão logo Circe consegue ter clara sua visão de mundo, surge então a mulher vigorosa e firme disposta a enfrentar qualquer perigo, de modo que é um livro que aborda, discute e representa as questões do feminino. A Circe de Miller encarna então as diferentes lutas das mulheres, inclusive a maternidade e o sentimento "leoa" despertado desta relação, que no caso deste livro será talvez a mais intensa vivenciada pela narradora;

8 - Além disso, a narrativa não perde o encanto das histórias e aventuras originais da Odisseia, cultura já assimilada até mesmo por quem não tenha lido a obra, visto sua presença na cultura global. Todos os elementos e criaturas fantásticas estão presentes no romance, seus monstros, criaturas e cenários fantásticos e imaginativos que tramam uma rede sólida de acontecimentos;

9 - Mas embora o fantástico tenha sua relevância, é pelas nuances que o romance aqui se concretiza. São as redes, os não-ditos, as intenções mascaradas, que fazem da narrativa uma constante armadilha, o que acaba só aprisionando a todos numa relação perpétua de desconfiança perante os constantes perigos e armadilhas, que no computo final, querem dizer do poder e das diferentes formas de manipulá-lo. Por isso a narração de Circe por vezes fica ácida e crítica, quando não, fechada em suas próprias agruras, o que também, claro, é fundamental para dar as cores da personagem;

10 - Enfim, Circe adentra a um grupo de narrativas que procura dar voz a vozes um tanto encobertas, revisitando uma personagem envolta de alguma névoa, mas cada vez mais presente na cultura popular. Ademais, traz ainda importante posicionamento, porque não pode-se ler o livro sem ter em mente a luta e a força feminina. Em termos gerais é boa ficção e um bom divertimento, que não só revela outras possibilidades à Odisseia, mas revisita e vitaliza mitologia muito presente entre nós.





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