Depois do The New York Times a Folha fez sua versão de lista com Melhores do século XXI. Já comentamos que não vemos muito sentido em fazer lista de obras de um século que ainda engatinha, mas, tudo certo. A da Folha nasceu com uma seleção de 100 notáveis que deram seus pitacos (veja a lista aqui) que até gerou uma lista, mas não adianta, lista que é lista sempre fica faltando algo. Por isso selecionamos 10 livros brasileiros que poderiam estar na lista, mas foram esquecidos:
1 - O cheiro do ralo, de Lourenço Mutarelli: Tudo bem que o Muta pode ser intragável a algumas pessoinhas, mas não cremos que se possa deixar o autor fora de qualquer lista de melhores de seu tempo. No caso desse livro temos um clássico de pronto, complexo, marcado pelas referências ao mesmo tempo que integra o ordinário da existência com a alta cultura. Isso tudo sem falar da estética, Mutarelli é um artesão da linguagem desde sua estréia e como poucos conspurca a linguagem de modo a constituir uma obra de força literária;
2 - Desesterro, de Sheyla Smaniotto: Não adianta, volta e meia acabo citando este livro, e não é de graça não. Uma linguagem para lá de literária e uma imersão nas questões do feminino e a aridez da existência das mulheres. Curiosamente uma das obras mais feministas que li e, parece-me, pouco lida entre mulheres, inclusive. A narrativa é de uma brasilidade que não podemos deixá-la fora de uma lista assim;
3 - Depois do Fim, de Alex Bezerra de Menezes: Muito provavelmente o romance menos conhecido de nossa lista, uma obra quase que artezanal. Há predicados suficientes para que fosse mais reconhecido, do uso da linguagem marcada pela literariedade como o fato de ser uma das primeiras e mais eficientes tentativas de nossa literatura tentar compreender a transição do final da ditadura para nossos primeiros anos de democracia, tudo isso marcado por questões complexas do que é o Brasil;
4 - Marrom e Amarelo, de Paulo Scott: A questão étnica e racial está bem representada e presente na lista da Folha, mas para estar completa falta este, isso porque é dos poucos romances que consegue tratar da miscigenação com alguma sobriedade e dentro da complexidade que o tema exige. Um romance incrível dos dramas e dos entre-lugares da racialidade no Brasil;
5 - Orelha lavada, infância roubada, de Sandra Godinho: A poesia com que olha as tragédias da infância no Brasil deveria tornar este livro leitura obrigatória nas escolas, por pais e gestores (professores bem podem dizer do quão assertivo é o olhar de Godinho) políticos. O livro é uma candura ao msmo tempo que trata e apresenta os cenários mais atrozes às crianças e adolescentes numa denúncia do que estamos fazendo com nosso próprio futuro;
6 - Vento Vazio, de Marcela Dantés: Falando em autoria feminina, temos aqui mais um grande nome de nossa literatura em uma obra que não só traz a brasilidade, bem como, é nitidamente uma narrativa latino-americana marcada por seu realismo mágico característico. Do mesmo modo, tanto como tema como linguagem é uma das narrativas mais potentes lidas por nós nos últimos anos;
7 - A cabeça do santo, de Socorro Acioli: Falando em brasilidade e realismo mágico, temos aqui uma narrativa de puro suco do que é o Brasil em seus rincões mais ermos e íntimos, tudo isso narrado com o humor que nos é característicos e a partir de uma realidade que se amplia de tal modo que é também inacreditável;
8 - Oeste - A guerra do jogo do bicho, de Alexande Fraga: Livros de potencial popular também deveriam ser melhor avaliados e considerados, contudo, ainda parece persistir certa pecha de literatura menor. Essa obra traz uma análise visceral a partir do Rio de Janeiro de todo um Brasil marcado pelo crime e pela violência cujas relações mais íntimas com os mais diferentes estratos sociais são discutidos;
9 - Nunca o nome do menino, de Estevão Azevedo: Uma prosa marcada pela linguagem poética, as frases tomam nossa leitura quase que como música. Romance interessantíssimo sobre identidades e ausências e com um final digno das grandes obras que bem merecia ter sido lembrado;
10 - Todos nós adorávamos caubóis, de Carol Bensimon: Uma trip road imersiva tanto na paisagem do Rio Grande do Sul como na intimidade das personagens marcadas pelas suas dúvidas, contradições e anseios surgidos a partir da sexualidade. Uma narrativa relevante das discussões LGBTQIA+ da contemporaneidade.