10 Considerações sobre A era da escuridão ou sobre confie em sua graça

 O Blog Listas Literárias leu A era da escuridão, de Katy Rose Pool publicado pela editora Suma; neste post as 10 considerações de Douglas Eralldo sobre o livro, confira:

1 - Ficção de fantasia estilo medieval mas com um toque bastante forte de X-Men, A era da escuridão entrega-nos personagens que se fixam e uma narrativa marcada por muita ação e movimento, tudo isso num cenário em que o encantamento e a magia são possíveis assim como a cisão do mundo em virtude da Graça possível a parte da sociedade narrada. Tudo isso, claro, movimenta esse ambiente explosivo e marcado, por que não, pela ira da frustração;

2 - A narrativa gira em torno de profecias, mas especialmente na divisão de seu universo narrativo entre aqueles que desenvolvem habilidades especiais, aí aquele toque mutante, e os que acabam não sendo agraciados com a  Graça. Os agraciado, nesse contexto, controlam de certa forma este universo à sombra dos profetas, o que alimenta então o desejo de vingança e purgação pois acredita-se que esse mundo esteja corrompido e que seja fundamental o acerto de contas a dar cabo da corrupção moral e social;

3 - Vejamos que os intertextos religiosos participam da narrativa do princípio ao fim, pois que as crenças e as seitas conduzirão as ações do livro ao fundo da movimentação de seus protagonistas. Aliás, tudo isso se engendra numa teia um tanto complexa, pois se ao cabo a vilania está do lado dos frustrados, do grupo do Hierofante que pretende purgar o mundo dos agraciados, esta posição acaba por naturalizar sem maiores discussões o fato de uma elite agraciada - por fatores aleatórios - com habilidades especiais controle e gerencie esse mundo;

4 - Tudo isso talvez não nos atire a uma reflexão dialética sobre o medo do poder, ou o medo daqueles que possuam poderes e habilidades superiores. Essa pode ser uma discussão interessante no devir de um futuro próximo, quando o poder financeiro pode viabilizar poderes especiais - já que naturalmente desenvolvemos medo daqueles que possam mostrar-se em uma evolução muito superior à nossa espécie. È uma discussão interessante que, entretanto, na narrativa é atirada à vilania e a doença do fanatismo, aqui, mais um elemento de contato interessante com seu próprio tempo;

5 - A bem da verdade o livro parece trazer uma série de elementos de seu próprio tempo à narrativa, começando pela polarização. Temos aqui uma jornada polarizada em que cinde o mundo entre o eu - e o grupo do eu - e os outros. Uma guerra de dois lados e mantida por alianças marcadas por interesses - e estimuladas pela frustração. A atmosfera religiosa é a corrupção de parte de sua elite é outro elemento que evoca todas as desconfianças contemporâneas;

6 - Além disso, na construção de suas personagens a narrativa não deixa de fora uma tendência forte da fantasia atual, a de dar visibilidade a pautas identitárias, visto que seus personagens - ou muito deles - não de pautam pelo binarismo, por exemplo. Alguns, aliás, transpõe para a narrativa as dúvidas e anseios quanto à sexualidade. Nesse sentido, vale dizer que a despeito da chiadeira de grupos conservadores - alguns toscos mesmo - está longe de uma exigência de pauta, qualquer pessoa com o mínimo de conhecimento histórico bem sabe que, por exemplo, entre as nações marcadas pela guerra, a homossexualidade era algo natural, não é mesmo, guerreiros espartanos e gregos?

7 - Aliás, falando em personagens, enquanto fantasia podemos perceber na estrutura da narrativa marcas e influências da fantasia contemporânea, especialmente, talvez, o trabalho de Martin ecoando na narrativa. Especialmente no fato de Pool assim como o autor optar por narrar a partir de diferentes focos narrativos acompanhando diferentes personagens, só que aqui, de uma forma um tanto mais restrita que em As crônicas do gelo e do fogo. Ainda assim, a pluralidade de focos narrativos é uma das marcas do texto;

8 - Quanto às personagens em si, muitas protagonistas mostram-se deveras interessante. Algumas delas marcadas pela contradição entre o "bem" e o "mal" e marcadas por ações questionáveis e não livres de contradições e práticas por vezes questionáveis. São personagens que procuram certa gradação cinzenta e em muitos momentos são marcados pelas reticências e pela tentativa de afastamento daquilo que são ou que deveriam ser... aí, quem sabe, mais um debate, o destino, ou melhor, a predestinação;

9 - Contudo, se há algum elemento passível de maior crítica está em certa previsibilidade dos acontecimentos e no destino de certos personagens. Isso porque talvez tenhamos nos acostumados com os dissimulados ou com os muito dispostos, já que estas figuras evocam lembranças de figuras semelhantes. Na verdade o que se pretende dizer aqui é que ao leitor mais experiente no gênero alguns acontecimentos ou destino de certos personagens a despeito da tentativa de manter-se com algum mistério, acaba se mostrando um tanto previsível e esperado;

10 - Enfim, A era da escuridão é uma narrativa cheia de fôlego, com muita ação - a parte final especialmente mostra uma elevação desta ação - e personagens que se fixam no imaginário de seus leitores. Há nesta fantasia ecos de questões contemporâneas além de algo que para os leitores deste gênero é sempre um elemento relevante, os ares de um jogo de RPG com personagens em intensa movimentação e possibilidades distintas, além, é claro, das habilidades e da "magia" envolvendo todos os caminhos.

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