10 Considerações sobre Cinco Máscaras, de Carlo Antico ou sobre a velha busca pela cura de todos os males

O Blog Listas Literárias leu Cinco Máscaras, de Carlo Antico publicado pela editora Labrador; neste post as 10 considerações de Douglas Eralldo sobre o livro, confira:

1 - Cinco Máscaras nos foi enviado pela editora Labrador como forma de conhecermos o resultado de seu trabalho que dá-se exclusivamente no campo da autopublicação e, com uma política diferenciada neste segmento. Nesta questão, em termos de edição e cuidados com o objeto livro, podemos verificar que a publicação não perde em nada para as publicações tradicionais, de modo que temos de fato uma edição bem cuidada, o que por si só é um grande ganho, pois, não raro, tratamos aqui no blog de diversas obras autopublicadas cujos problemas de edição colaboraram para uma percepção mais negativa da leitura. Não é o caso aqui. Este volume é uma bonita edição e cuidadosa em todos os detalhes pertencentes a esta esfera da publicação, o que deixa-nos então livres para observarmos tão somente os aspectos de construção literária da obra;

2 - Cinco Máscaras passeia por uma série de elementos e questões que há tempos são refletidos pela literatura. Da antiga procura pela cura de todos os males e doenças, cujo diálogo com Shangri-La é sempre presente, e o universo das teorias da conspiração, de modo que se há uma tentativa de produção de thriller, com alguns êxitos e alguns problemas de construção, a partir do enredo que conta a jornada de Prince Lafitte e sua existência cosmopolita em busca de uma lenda capaz de curar um amigo do câncer;

3 - Enquanto thriller de teoria da conspiração, o livro encontra algumas barreiras que o distanciam de obras que se tornaram popular, especialmente após o sucesso de Dan Brown com seu O Código Da Vinci. Embora promissor por tratar-se de um jovem vexilologista, que estuda bandeiras, o romance perde enquanto teoria por seu prólogo altamente elucidativo e pelas fragilidades no tecer da rede conspiratória, descoberta com três ou quatro cliques no Google (ainda que haja a ida a livraria de obras raras), o que traz outro problema para o livro. Em síntese, a conspiração não parece conter aqui a complexidade e a densidade de outras obras semelhantes;

4 - Além disso, a linearidade estendida da narrativa afasta-o do thriller, narrativas cujo tempo é sempre o da emergência. Após um prologo que entrega em demasia, há certo anticlímax, pelo menos na primeira metade do romance, em que os capítulos seguem narrando a história pregressa de Prince, desde seus pais, ao seu nascimento, crescimento, etc. Esta primeira parte, aliás, vai produzindo no leitor certo estranhamento pelo distanciamento com o prologo que aproxima-se novamente do enredo apenas na segunda metade do livro, quando já então adulto, Prince tenta encontrar o tônico capaz de salvar seu amigo;

5 - Portanto a escolha do tempo da narrativa traz seus impactos ao romance, mas talvez menos problemático que a construção dos personagens, incluindo neste grupo, seu protagonista, Prince. São personagens um tanto quanto superficiais (e que em grande parte habitam um mundo de Poliana), que ao leitor mais exigente, soam pouco plausíveis. Inverossímeis. Inclusive os diálogos entre eles acentuam o problema, de modo que os personagens do livro têm certa dificuldade de nos convencer de suas existências. Isso claro, passa pela postura e cobrança do leitor, este, por exemplo, não se convenceu de que amigos conversam da forma como são os diálogos no livro. Além disso, a própria relação entre personagens se dá sempre com certa distância, inclusive entre o grupo de amigos, o que acentua o problema;

6 - Mas há uma questão presente nos personagens que merece certa atenção. Um observação curiosa que talvez reflita nossos tempos presentes e o tardio amadurecimento das personalidades. Creio que até tenha vindo ao livro de forma inconsciente, mas é deveras interessante que embora protagonizado por personagens adultos, Afinal, Prince quase o é um homem de trinta anos, os personagens portam-se como ainda adolescentes, inclusive com certa distorção na visão de mundo. É como se estivéssemos lendo uma romance juvenil, aparência que encontra ecos na estética da escrita, mas com personagens adultos. Isso meio que cria um efeito Peter Pan na narrativa e gera certo contraste, visível a olhares mais perscrutadores;

7 - Além desta questão anterior que poderíamos aproveitar numa discussão crítica, podemos ainda destacar qualidade na ambientação, que embora estrangeira, o autor aproveita para demonstrar sua própria natureza viajante pelo mundo, aproveitando sua narrativa para compartilhar esse conhecimento pessoal. Isso traz certa verdade à narrativa, pois quanto ambientação tal conhecimento é bastante convincente. Por outro lado, embora bastante virtuosa, a ambientação escrita com propriedade abre a edição para um problema que pode irritar determinados tipos de leitores...

8 - Falo aqui do excesso de notas de rodapé, problema que nesse caso talvez possa ser dividido na edição. O livro possui muitas notas de rodapé, o que num romance sempre vejo como problema, já que tais notas afastam o leitor do que importa realmente, a narrativa, local onde tudo deve estar revelado. Algumas notas, inclusive são desnecessárias como esta na página 19, "fechou então seu caderno e foi para o Fenway Park*, onde sua família tinha assentos privilegiados bem atrás do banco de reservas dos Red Sox". Vejamos que as informações necessárias já estão no texto, tornando inútil a explicação do rodapé "*Estádio dos Boston Red Sox". Isso cria uma distração incômoda e conforme o leitor, poderá ser encarada como insulto, pois, a inferência no texto é bastante clara. Existem um bom bocado de exemplo como este, de notas dispensáveis, e alguns outros em que o autor usa as notas como reforço de sua erudição ou conhecimento de mundo, o que pode causar também ruídos na leitura, especialmente porque em termos de literatura é sempre preferencial que a narrativa denude e revele todas as coisas;

9 - Claro, são concepções deste leitor, e também de uma leitura mais crítica como geralmente procuramos fazer aqui no blog. Em geral, somado a tais apontamentos, temos um conjunto de elementos que ora conferem aspectos positivos ao livro, ora fazem saltar não elementos negativos, talvez elementos que pudessem ter sido melhor trabalhados. É uma obra de ótimo domínio linguístico, bem escrita, e com  intencionalidade de construir uma aventura. Seus pecados estão mais na esfera do literário, pois enredo, personagens e tempo da narrativa acabam produzindo ruídos em sua essência;

10 - Enfim, dotada de certa simplicidade, entre erros e acertos, Cinco Máscaras é uma narrativa dinâmica, cuja linearidade traz seus momentos de ação e intensidade. Há por certo coisas que poderiam ser diferentes no romance, mas este por certo é um caminho que Carlo Antico está construindo com bastante dedicação.


    

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